domingo, 31 de outubro de 2010

Limite Branco - Caio Fernando Abreu

"Só agora eu sinto que as minhas asas eram maiores que as dele, e que ele se contentava com os ares baixos; eu queria grandes espaços, amplitudes azuis onde meus olhos podiam se perder e meu corpo pudesse se espojar sem medo nenhum. Queria e quero - ainda. Voar junto com alguém, não sozinho. Mas todos me parecem tão fracos, tão assustados e incapazes de ir muito longe. Talvez eu me engane, e minhas asas sejam bem mais frágeis que meu ímpeto. Mas se forem como eu imagino, talvez seja fadado a solidão.
Quando escrevo poesia, é sobre isso que escrevo: o medo da solidão como sina. E vivo a lavrar o campo, a limpar a casa, a colocar as coisas nos seus lugares certos; só que o que eu espero é a Desejada, não a Indesejada. Eu espero a Vida, não a Morte. Não sei se ela virá. E não sei se apenas por estar dentro dela, isso significa que ela esteja em nós, em mim."

sábado, 23 de outubro de 2010

Do Desejo - Hilda Hilst

Que canto há de cantar o que perdura?

A sombra, o sonho, o labirinto, o caos

A vertigem de ser, a asa, o grito.

Que mitos, meu amor, entre os lençóis:

O que tu pensas gozo é tão finito

E o que pensas amor é muito mais.

Como cobrir-te de pássaros e plumas

E ao mesmo tempo te dizer adeus

Porque imperfeito és carne e perecível



E o que eu desejo é luz e imaterial.



Que canto há de cantar o indefinível?

O toque sem tocar, o olhar sem ver

A alma, amor, entrelaçada dos indescritíveis.

Como te amar, sem nunca merecer?

Amavisse - Hilda Hilst

Como se te perdesse, assim te quero.

Como se não te visse (favas douradas

Sob um amarelo) assim te apreendo brusco

Inamovível, e te respiro inteiro



Um arco-íris de ar em águas profundas.



Como se tudo o mais me permitisses,

A mim me fotografo nuns portões de ferro

Ocres, altos, e eu mesma diluída e mínima

No dissoluto de toda despedida.



Como se te perdesse nos trens, nas estações

Ou contornando um círculo de águas

Removente ave, assim te somo a mim:

De redes e de anseios inundada.

(II)




Descansa.

O Homem já se fez

O escuro cego raivoso animal

Que pretendias.

(Via Vazia - VIII)

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Um sopro as 6 da manhã - Gabizão

Fuma cigarro como ninguém, aliais, lembra apenas as mulheres do cinema Frances da década de 50. Musa. Impecável. Uma caipirinha acompanha. Uma , duas, três. Embalava como ninguém meus sonhos e desejos mais íntimos e belos. Puros. Menina com sotaque português, cabelos levemente queimados, assim como sua pele de tons avermelhados como um por do sol em Búzios. Caminhava pelas ruas charmosas e de pedras como se estive na sala de estar ouvindo uma valsa ou um velho fado português. Conspira a bailarina!


Fala olhando nos olhos como quem lê um romance e revela todos meus segredos. Moleca. Dança aos ruídos dos carros como se estive em uma boate vazia. Leve. Adora receber carta. Avessa a computadores e a todas as redes sociais. Prefere contato olhos nos olhos. Maestria. Capaz de acabar com a vida de qualquer ser que tente aproximar.


Braços abertos, nunca se cruzam para novas experiências ou para o mundo. Sem apetrechos, frescuras ou coisa parecida. Livre. O jeito de falar enquadra, intimida e ao mesmo tempo não é rude. O importante é a diversão. Não tem ídolos. Adora animais. Usa meias multicolores e cachecol.


No campo, na praia não importa, sempre se sente em casa. Quando triste, meio down pede Bourbon, também adora whisky nacional e ouvir Bethania. Ela me fez ver tudo diferente. Comporta-se bem em qualquer ambiente, até a segunda dose.


Apenas a vi uma vez, atravessando a rua me olhou nos olhos e desapareceu. Como uma brisa fria as 6 da manha. Vento ligeiro. Foi exatamente a hora que ela que sumiu no meio da neblina. Nunca mais a vi.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

A Alvorada Do Amor - Olavo Bilac

Um horror, grande e mudo, um silêncio profundo
No dia do Pecado amortalhava o mundo.
E Adão, vendo fechar-se a porta do Éden, vendo
Que Eva olhava o deserto e hesitava tremendo,
Disse:

Chega-te a mim! entra no meu amor,
E e à minha carne entrega a tua carne em flor!
Preme contra o meu peito o teu seio agitado,
E aprende a amar o Amor, renovando o pecado!
Abençôo o teu crime, acolho o teu desgôsto,
Bebo-te, de uma em uma, as lágrimas do rosto!

Vê tudo nos repele! a tôda a criação
Sacode o mesmo horror e a mesma indignação...
A cólera de Deus torce as árvores, cresta
Como um tufão de fogo o seio da floresta,
Abre a terra em vulcões, encrespa a água dos rios;
As estrêlas estão cheias de calefrios;
Ruge soturno o mar; turva-se hediondo o céu...

Vamos! que importa Deus? Desata, como um véu,
Sôbre a tua nudez a cabeleira! Vamos!
Arda em chamas o chão; rasguem-te a pele os ramos;
Morda-te o corpo o sol; injuriem-te os ninhos;
Surjam feras a uivar de todos os caminhos;
E, vendo-te a sangrar das urzes através,
Se amaranhem no chão as serpes aos teus pés...
Que importa? o Amor, botão apenas entreaberto,
Ilumina o degrêdo e perfuma o deserto!
Amo-te! sou feliz! porque, do Éden perdido,
Levo tudo, levando o teu corpo querido!

Pode, em redor de ti, tudo se aniquilar:
Tudo renascerá cantando ao teu olhar,
Tudo, mares e céus, árvores e montanhas,
Porque a Vida perpétua arde em tuas entranhas!
Rosas te brotarão da bôca, se cantares!
Rios te correrão dos olhos, se chorares!
E se, em tôrno ao teu corpo encantador e nú,
Tudo morrer, que importa? A natureza és tu,
Agora que és mulher, agora que pecaste!
Ah! bendito o momento em que me revelaste
O amor com teu pecado, e a vida com o teu crime!
Porque, livre de Deus, redimido e sublime,
Homem fico na terra, luz dos olhos teus,
Terra, melhor que o Céu! homem maior que Deus!

domingo, 17 de outubro de 2010

Via Lactea - Olavo Bilac

"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto,
E abro as janelas, pálido de espanto...


E conversamos toda a noite enquanto
A via láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E ao vir do Sol, saudoso e em pranto
Inda as procuro pelo céu deserto.


Direis agora: "Tresloucado-amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Têm o que dizem, quando estão contigo?"


E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas."

Acrilírico - Veloso/Duprat

Olhar colírico
Lirios plásticos do campo e do contracampo
Telástico cinemascope teu sorriso tudo isso
Tudo ido e lido e lindo e vindo do vivido
Na minha adolescidade
Idade de pedra e paz

Teu sorriso quieto no meu canto

Ainda canto o ido o tido o dito
O dado o consumido
O consumado
Ato
Do amor morto motor da saudade

Diluído na grandicidade
Idade de pedra ainda
Canto quieto o que conheço
Quero o que não mereço
O começo
Quero canto de vinda
Divindade do duro totem futuro total
Tal qual quero canto
Por enquanto apenas mino o campo ver-te
Acre e lírico o sorvete
Acrilíco Santo Amargo da Putrificação

sábado, 16 de outubro de 2010

Como Dois e Dois - Caetano

Quando você
Me ouvir cantar
Venha não creia
Eu não corro perigo
Digo, não digo, não ligo
Deixo no ar
Eu sigo apenas
Porque eu gosto de cantar...

Tudo vai mal, tudo
Tudo é igual
Quando eu canto
E sou mudo
Mas eu não minto
Não minto
Estou longe e perto
Sinto alegrias
Tristezas e brinco...

Meu amor!
Tudo em volta está deserto
Tudo certo
Tudo certo como
Dois e dois são cinco...

Quando você
Me ouvir chorar
Tente não cante
Não conte comigo
Falo, não calo, não falo
Deixo sangrar
Algumas lágrimas bastam
Prá consolar...

Tudo vai mal
Tudo, tudo, tudo, tudo
Tudo mudou
Não me iludo e contudo
A mesma porta sem trinco
Mesmo teto, mesmo teto
E a mesma lua a furar
Nosso zinco...

Meu amor!
Tudo em volta está deserto
Tudo certo
Tudo certo como
Dois e dois são cinco
Meu amor! Meu amor! Meu amor!
Tudo em volta está deserto
Tudo certo
Tudo certo como
Dois e dois são cinco...

domingo, 10 de outubro de 2010

"Então me vens e me chega e me invades e me tomas e me pedes e me perdes e te derramas sobre mim com teus olhos sempre fugitivos e abres a boca para libertar novas histórias e outra vez me completo assim, sem urgências, e me concentro inteiro nas coisas que me contas, e assim calado, e assim submisso, te mastigo dentro de mim enquanto me apunhalas com lenta delicadeza deixando claro em cada promessa que jamais será cumprida, que nada devo esperar além dessa máscara colorida, que me queres assim porque assim que és..." CFA

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Let It Grow

Taking time to find the right line
Talking easy with the thoughts you want to share
Leaning down, feel you growing in my mind
Stealing down, going down, feel you growing in my mind

It's got to be slow, taking love the only way
It's got to just flow, making love and taking time to let it grow

Finding ways to find the real you
Spending days just holding hands and feeling free
Play around, watch the sunshine coming through
Come around, stay around, watch the loving grow with you.

It's got to be slow, taking love the only way
It's got to just flow, making love and taking time to let it grow

Loving you the love you gave me
Living love with the things we have share
Poetry, hear the words you say to me
Stay with me, here with me, keep our loving flowing free.

It's got to be slow, taking love the only way
It's got to just flow, making love and taking time to let it grow